Badasso's Blog

segunda-feira, maio 24, 2004

The Talented Mr. Ripley

Hoje é 2ªFeira. Este é unânimamente o dia mais odiado e amaldiçoado por todos aqueles que trabalham, ou pelo menos aqueles que, quando se inicia a semana, não podem prosseguir em pleno as actividades a que se dedicaram nos dois dias anteriores. Confesso que também eu já nutri uma antipatia raivosa pelo dito dia, principalmente quando estava a meio do Domingo e percebia que o fim de semana estava a acabar, agarrando-me a cada hora como se fosse um condenado à morte com hora marcada com o carrasco. Felizmente que ultrapassei essa fase, cheguei à brilhante conclusão que o fim de semana vai até à hora em que eu me deitar, podendo e devendo ser aproveitado na sua plenitude, sendo a 2ª Feira um dia igual aos outros. Assim sendo, levantei-me hoje cedo e cumpri o meu rotineiro ritual de ida para o emprego, constatando a cada momento a veracidade da minha teoria de que os portugueses à 2ª Feira acordam todos mais tarde que o habitual. O comboio vai mais vazio, o trânsito é mais fluído e os próprios passeios desempedidos levam-me por vezes a relembrar a famosa cena de Tom Cruise em "Vanilla Sky", numa Times Square vazia de gente. Quando no meu habitual trajecto a pé passo à porta do nosso primeiro, o Durão, ainda o seu veiculo não se encontra à vista, o cavalheiro só sai depois das 09:30. Ainda não são 8 horas quando chego ao local de trabalho, local esse que encontro igualmente vazio. A minha colega madrugadora está de férias pelo que num andar onde trabalham cerca de 15 pessoas estou prácticamente só. Começo a escrever e pela janela observo a minha recém adquirida vista sobre a Praça de Alvalade. Quando se passam vários anos numa cave com vista para um mágnifico frigorifico negro da IBM qualquer janela ganha uma importancia capital, ainda que com vista para um beco ou um descampado. Acabei por ter sorte na janela que me atribuiram, do meu lugar posso ver a Avenida larga que se estende para lá do Sto.António bem como um grande pedaço de céu, riscado apenas pelas aeronaves que de tempos a tempos se fazem à pista do aeroporto da Portela. Por esta altura já todos se interrogam do que esta história tem a ver com o título do artigo. Já lá vamos. No sábado fui jantar com os meus amigos João e Rui, companheiros habituais de almoços e jantaradas, bem nutridas e melhor regadas (a rima foi acidental). Os três partilhamos algumas paixões, uma das quais o gosto por refeições demoradas em alegre convivência na companhia dos amigos e de uma ou mais garrafas de Monsaraz, tinto evidentemente. Se não houver, serve Monte Velho. De entre os vários temas que aflorámos nessa noite entre cada garfada de um excelente leitão de Negrais, devo sublinhar uma conversa sobre um assunto rotineiro entre nós, o cinema. Devo desde já dizer que somos os três apreciadores indefectiveis da 7ª Arte e possuidores todos nós de uma significativa e diversificada biblioteca de DVD's. Filme puxa filme e a coisa acaba por descambar naquele que, na opinião dos meus distintos companheiros é um filme de paneleiros e para paneleiros. "The Talented Mr. Ripley", na versão nacional e num momento rarissimo de inspiração dos tipos que decidem os nomes dos filmes em portuga, "O Talentoso Sr.Ripley". Para quem não viu o filme tentarei então explicar a história. O Ripley é um rapazola pobre que viveu toda a vida como criado dos ricos e que tem um certo talento para a aldrabice e para imitar, tanto as assinaturas como as expressões e vozes de outras pessoas. O tipo devia sem dúvida ter ido para a politica. Certo dia e no decurso de mais uma das suas petas surge a oportunidade de viajar para a Europa, Itália mais precisamente, em busca do filho de um milionário que afirma conhecer. Tudo tanga. Aí chegado apaixona-se primeiro pelo estilo de vida que encontra e depois pelo tal rapaz filho do tal milionário. Nesta fase a teia de mentiras em que se envolve é já considerável, sendo exponencialmente aumentada quando o nosso Ripley num momento de loucura avassaladora e homicida mata o Dickie, era assim que se chamava o jovem playboy, e assume a sua identidade, entrando num perigoso e excitante jogo de sexo, mentiras e vídeo. Bem, tudo menos o sexo e o vídeo, mas não resisti ao trocadilho. A policia italiana entra em cena e assistimos a um conjunto de manobras inteligentes por parte do personagem principal para escapar à captura, isto tudo enquanto tem de manter a fachada sobre duas ou três identidades que já tinha assumido. Imaginem que sempre que falam com uma pessoa diferente têm de dar um nome diferente. Complicado não ? E se duas pessoas que o conhecem com diferentes nomes se encontram ? As possibilidades são infinitas e o filme é extremamente interessante e inteligente, ainda que não sendo própriamente um 'action movie'. Os pormenores postos nos cenários, especialmente na caracterização da pequena vila italiana à beira mar onde se passa a maior parte da acção são fabulosos. Gwyneth Paltrow, Jude Law e Cate Blanchett acompanham na perfeição Matt Damon num elenco fabuloso. E a verdade é que em nenhum momento do filme se observa qualquer cena homossexual explicíta, o que no entender do João faz dele um filme para paneleiros, maricas e outros apelidos igualmente coloridos com que os meus amigos me brindam sempre que se fala na coisa. Vá-se lá entender esta gente...
Ontem por acaso e nem de propósito vi o trailer do filme que começa onde este acaba, "Ripley's Game". Para um cinéfilo como eu é vergonhoso admitir que este é já um filme de 2002 e que eu nem o conhecia, principalmente quando gostei tanto do primeiro. Mas enfim, acontece aos melhores. Neste segundo filme já não entra o Matt Damon, quanto a mim um dos grandes trunfos da obra original, em sua substituição e até porque a história se passa numa fase bem mais adiantada da vida do personagem aparece agora outro actor de renome, John Malkovich. Não será por aí portanto que a qualidade vai faltar. O que me surpreendeu no trailer deste filme foi ter ficado com a idéia, talvez errada, os trailers são mesmo assim, de que o nosso Ripley se transformou num assassino profissional, tal é a quantidade de sangue que se vê pelo ecrân em tão curto espaço de tempo. Se assim fôr parece-me que não vou gostar tanto desta versão. Um dos pontos fortes do primeiro filme era observar o drama intimo do nosso amigo mentiroso bem como a luta que travava contra si mesmo sempre que tinha de pisar o risco. Agora pelos vistos o risco já não existe.